O MDIC - Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços foi extinto em janeiro de 2019.
A alteração, segundo o Governo Federal, ocorreu para reduzir o número de ministérios e “enxugar” a máquina pública.
A saída encontrada pelo governo foi a criação do Superministério da Economia que absorveu as funções dos seguintes ministérios: Fazenda; Planejamento, Desenvolvimento e Gestão; Indústria, Comércio Exterior e Serviços; e Trabalho.
Desde então, a indústria deixou de contar com uma pasta exclusiva, o que se reflete na falta de representatividade do setor nas pautas governamentais e na falta de desenvolvimento de políticas industriais efetivas que ajudem, sobretudo, as micro, pequenas e médias empresas.
Para Fausto Augusto Junior, diretor técnico do Dieese - Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos, o primeiro problema da concentração ministerial foi a perda de foco, já que, em sua visão, nos governos anteriores existiram tentativas de construção de políticas industriais. “Umas melhores, outras piores, mas havia foco”, afirma.
Na opinião do diretor, a opção por não contar com uma pasta exclusiva para o setor industrial também promoveu a perda de capital humano, já que alguns especialistas tinham um importante posicionamento dentro de áreas estratégicas, como a de Comércio Exterior:
“Esta não é uma discussão simples, estamos o tempo todo lidando com interesses globais e de grandes corporações e nestes processos acontecem muitas negociações internacionais. A Secex - Secretaria do Comércio Exterior era um mecanismo vinculado ao MDIC. Tudo isso foi perdido. Assistimos ao desmanche de estruturas que dialogavam e negociavam com o setor empresarial. Isso foi muito ruim”.
Para exemplificar, cita o setor automotivo, que nos últimos tempos assiste à saída de algumas montadoras, como a Ford, do país.
“Nas montadoras já havia um projeto de concentração de nichos de produção e o Brasil estava no páreo.
A partir da desorganização ministerial a gente passou a assistir as montadoras escolherem desenvolver tecnologia fora do país, em suas matrizes, e produzirem na China ou no México.
Perdemos investimentos e empregos em um momento bastante complicado, de transição tecnológica”, explica. “Nós estamos falando apenas de um setor, mas essa crise se desdobrou para todos os outros setores da economia”, complementa.
Atualmente, o mercado global vem sendo bastante afetado pela falta de componentes eletrônicos, como os semicondutores, fabricados na China.
Essa pauta vem gerando novos questionamentos sobre a necessidade de mudanças nas cadeias globais de valor. Para o Augiusto Jr., essa é mais uma oportunidade que o Brasil perde por não ter projetos estruturados para a indústria. “Existe um debate sobre a produção desses itens, se deve continuar concentrada na China ou mudar. Nós, novamente, estamos fora disso. Com a ausência do MDIC não há ninguém orientado a pensar nessas questões”, diz.
Para ele, neste momento de transição tecnológica, de mudança de distribuição das cadeias globais e de alteração dos padrões de consumo, o Brasil tem dois caminhos: avançar ou “mais uma vez vai ficar para trás”.
O diretor do Dieese destaca que, nos últimos anos, o país vem em um processo de regressão produtiva muito grande, com perda de densidade e de setores estratégicos. Soma-se a isso os baixos investimentos em ciência e tecnologia.
“A gente vinha brigando para estar entre as cinco maiores economias do mundo, mas agora estamos caminhando para a 14ª posição. A Índia, por exemplo, é um país mais desigual do que o Brasil, mas que vem crescendo e constituindo outro tipo de economia por meio de investimentos em ciências e tecnologia. Esse é um debate urgente”, argumenta.
Outro problema citado é a falta de representação em reuniões ministeriais, que impede a movimentação de pautas entre setores.
Augusto Jr. aponta que o Ministério da Economia está focado integralmente em pautas orçamentárias, como a alta dos juros ou do câmbio, que são influenciadas pelo setor financeiro:
“O debate sobre a indústria não é prioridade. Ter extinto o MDIC e ter mantido o Ministério da Agricultura diz muito sobre as prioridades do Governo Federal. O setor agroexportador é incapaz de gerar a quantidade de emprego, de desenvolvimento e a renda que o Brasil precisa”.
Além do desmonte ministerial, o diretor menciona o BNDES - que nasceu para impulsionar a indústria -, mas teve a sua área industrial desmobilizada.
“Hoje, o principal elemento financiador da indústria tem o seu corpo técnico todo pulverizado. Quando a gente olha pra realidade de hoje, podemos dizer que a indústria ficou ao deus dará”. Desta forma, sem políticas para respaldar as suas demandas, a indústria fica sob a responsabilidade do mercado e muitas empresas de micro, pequeno e médio portes acabam fechando.
Questionado sobre o futuro, já que as próximas eleições são no próximo ano, Augusto Jr. fala que se houver mudança de perspectiva, a pauta industrial será retomada. “Os partidos que devem compor a oposição historicamente trabalham com ministérios e secretarias dedicadas à indústria. Mas é preciso ter projeto, não adianta ter ministério e não ter projeto”, explica.
Para o desenvolvimento de uma nova política industrial no Brasil, o diretor do Diesse reforça que é necessário articular a geração de novas lideranças para o setor.
“É fundamental que o Brasil construa uma nova elite industrial, um novo conjunto de empresários com uma visão mais moderna e que entenda o papel da indústria nessa nova relação entre os setores da economia. Que, acima de tudo, entenda o papel de desenvolvimento social da indústria em um país tão grande”.
Além disso, essa nova elite industrial precisa ter um olhar bastante cuidadoso com as micro, pequenas e médias empresas, que - se impulsionadas - são capazes de formar novos conglomerados industriais.
Para tanto, segundo ele, é preciso articular investimentos, fomentar ciência e tecnologia e dar suporte para a extensão industrial, oferecendo apoio para que essas empresas construam cadeias e elos.
“Estamos falando de empresas pequenas que podem adentrar o mercado global, como as start ups. É preciso mudar as mentalidades do governo, dos economistas e dos empresários. Tudo isso passa pelas pequenas empresas, que podem nos colocar na rota do desenvolvimento. Esse é o nosso maior desafio. Não é simples, não é fácil, mas é possível”, finaliza.
Fonte Usinagem Brasil
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