Atualmente, o cenário global é movimentado por incertezas, em questões de caráter econômico e político-social. Juntamente com a oscilação do mercado, a exigência dos clientes perante seus fornecedores torna-se maior, em busca de produtos diversificados, inovadores e de qualidade.
Com as tecnologias avançadas e a
competitividade crescente é gerada a necessidade pelas empresas por encontrar meios
para demonstrar diferenciação no mercado. As empresas de usinagem devem
focar na redução do tempo de indisponibilidade da máquina, dessa maneira é
necessário que o processo de preparação da máquina (setup) seja
rápido e preciso.
A redução do tempo de produção ou aumento de disponibilidade é de grande importância para a sobrevivência e crescimento das empresas em um ambiente competitivo, acarretando a busca por soluções e tecnologias para a determinada finalidade.
Uma dessas soluções tecnológicas para a redução do tempo de setup em máquinas CNC é a pré-ajustagem de ferramentas: externa (presetter) ou interna (toolsetter), porém atualmente, a parte majoritária das empresas brasileiras de usinagem utiliza o método manual.
Nestes casos, as empresas utilizam o método manual de
pré-ajustagem de ferramentas, pois os envolvidos no processo de produção
(gestores, encarregados e operadores) relacionam que esta etapa interfere
apenas no tempo de preparação da máquina. Este desconhecimento das vantagens é
o principal agravante da não utilização de sistemas automáticos de pré-
ajustagem de ferramentas pelas empresas.
Contudo,
pesquisas apontam que o efeito do processo de pré-ajustagem de ferramentas
realizada manualmente não está relacionado apenas à redução do tempo de setup, mas também a outros fatores do
processo de fabricação que podem vir a comprometer ainda mais o tempo
improdutivo, o aumento do custo de produção, a
confiabilidade e segurança do processo produtivo,
visto que estes fatores dependem diretamente da experiência e da prudência do
operador.
Portanto, o presente trabalho visa identificar se a realidade observada junto à um conjunto de empresas de usinagem da região de Limeira, no Estado de São Paulo, condiz com a situação relatada pelos diversos pesquisadores citados nos parágrafos anteriores.
Para tanto, foi realizada uma pesquisa de campo junto às
empresas, visando construir um breve diagnóstico da existência de influências
que a pré-ajustagem de ferramentas manual pode ocasionar, relacionadas ao
aumento do tempo improdutivo, aumento do custo de produção, confiabilidade e
segurança do processo.
Referencial Teórico
Para
avançar no entendimento do trabalho e nivelar o conhecimento e os termos
associados, é necessário compreender o conceito de alguns indicadores de
desempenho.
Produtividade
O foco principal das organizações é a busca pela competividade por meio do aumento da produtividade, tendo em vista que este fator possibilita gerar o alinhamento entre maximização de produção com a menor utilização de recursos e atividades, possibilitando a redução de custos.
Existem várias definições
para a produtividade, porém com a visão voltada para o processo de usinagem,
entende-se que é influenciada por determinados fatores, tais como: seleção do
método de usinagem; definição da ferramenta; redução de trocas de ferramentas; disponibilidade
do produto e; redução do tempo de setup. Com a efetividade desses fatores, consequentemente ocorre uma maior
disponibilidade e redução do tempo de máquina parada.
Essas paradas em máquinas CNC são habitualmente encontradas na preparação da máquina (setup), sendo assim, ocorrem perdas de produtividade em virtude da falta de disponibilidade da máquina durante esta etapa.
Perdas e desperdícios no processo de usinagem
Nos processos de produção há inúmeras perdas causadas por ociosidade. Podem ser por paradas para a preparação de máquinas e ferramentas associadas a produção de produtos, independentemente do tamanho dos lotes. Também ocorrem perdas nas operações de setup como movimentações desnecessárias dos operadores, peças em filas ou mudança de lotes.
Essas perdas são inteiramente ligadas ao processo de usinagem. A inclusão
de máquinas, ferramentas, métodos e sistemas no ramo da usinagem causa impacto
direto na melhoria da produtividade, redução de máquinas paradas e desperdícios
durante o processo. Uma das maiores causas para o elevado tempo de setup é a pré- ajustagem de ferramentas.
Pré-ajustagem de ferramentas
Nos
processos de usinagem, existem ajustes necessários para a preparação da máquina
para novos lotes. Um desses ajustes é a pré-ajustagem de ferramentas.
Durante o processo de pré-ajustagem de ferramentas em máquinas CNC, é
necessário inserir no comando da máquina as dimensões das ferramentas
(comprimento e diâmetro) para a usinagem da peça. Este processo pode ser
realizado de três diferentes maneiras :
- · Pré-ajustagem manual - é caracterizada pela medição das ferramentas diretamente na máquina e subdivide-se em:
- 1. Manual sem usinagem: é realizada a aproximação manual das ferramentas até a superfície da peça nas três coordenadas (X, Y e Z). Uma das técnicas para detecção do contato da ferramenta com a superfície é o uso de folha de papel, filme plástico ou suporte entre a ferramenta e a peça;
- 2. Manual com usinagem: após o processo manual de pré-ajustagem de ferramentas é fabricada uma peça teste na qual é feita a medição, e analisa-se a existência de discrepância entre as dimensões da peça fabricada e do projeto, e se houver diferença entre as medidas ocorre a compensação e correção das medições das ferramentas diretamente no comando da máquina.
- · Pré-ajustagem de ferramentas externa (Presetter) - é realizada fora da máquina, com o uso de sistemas de medição externos conhecidos como presetters, não interferindo na disponibilidade da máquina durante o processo de medição (sistema independente) e apenas sendo necessária a digitação das medidas das ferramentas diretamente no comando da máquina CNC.
- · Pré-ajustagem automática interna (toolsetter) - é realizada automaticamente na máquina com o auxílio de sistemas de presetting internos, conhecidos como toolsetters. Estes equipamentos são instalados sobre a mesa de trabalho ou em partes internas da máquina ferramenta, e toda a operação de medição da ferramenta é realizada de forma automática, apenas com a necessidade que o operador realize a fixação da ferramenta na máquina e informe as medidas aproximadas das ferramentas. São dois os tipos de sistemas de presetting internos existentes no mercado: por contato ou laser.
Fatores que impactam na eficiência do processo produtivo relacionados a pré-ajustagem de ferramentas
Existem vários fatores que impactam na funcionalidade e eficiência do desempenho das máquinas-ferramentas CNC relacionados aos tempos de preparação. As principais são relacionadas às técnicas de programação, transferência de programas para as máquinas, programação de máquinas, seleção de ferramentas e pré-ajustagem de ferramentas. Quando se trata do processo de pré-ajustagem de ferramenta, os envolvidos no processo de produção (gestores, encarregados, operadores) relacionam que esta etapa apenas interfere no tempo de preparação da máquina.
Pesquisas realizadas ratificam que a pré-ajustagem de ferramentas interfere no tempo de setup da máquina, e consequentemente nos tempos produtivos do processo de usinagem. Também apresentam que o uso de sistemas de pré-ajustagem de ferramentas externa (presetters) e pré-ajustagem automática interna (toolsetters) auxiliam na redução do tempo de setup.
Entretanto, pesquisas apontam que o efeito do processo de pré-ajustagem de
ferramentas realizadas manualmente não está relacionado apenas à redução do
tempo de setup, mas também de outros
fatores do processo de fabricação que podem vir a comprometer ainda mais o
tempo improdutivo, o aumento do custo de produção, a confiabilidade e segurança
do processo produtivo, visto que estes fatores dependem diretamente da
experiência e da prudência do operador (quadro 1).
Metodologia do desenvolvimento da pesquisa
A presente pesquisa faz parte do projeto FAPESP 2015/16593-6, intitulado “Diagnóstico da utilização de sistemas de pré-ajustagem (tool presetting) de ferramentas em empresas usuárias de máquinas CNC."
A metodologia do desenvolvimento da pesquisa foi baseada em uma pesquisa descritiva do tipo estudo de campo. Na pesquisa descritiva existe a utilização de técnicas padronizadas de coleta de dados, tais como o questionário e a observação sistemática, contemplando com o foco para a atuação prática.
A
seleção pelo estudo de campo ocorre por ter como objetivo uma pesquisa com
maior aprofundamento nas questões aplicadas, sendo necessário que o pesquisador
seja participante no ambiente ou com objeto pesquisado, instituindo-se por
método observatório e interrogativo.
O
intuito da presente pesquisa foi analisar se os fatores que impactam na
eficiência do processo produtivo relacionados a pré-ajustagem de ferramentas,
apresentados em pesquisas e descritas no quadro 1, se refletem nas empresas
prestadores de serviços de usinagem da cidade de Limeira/SP e região.
O
método para a obtenção das informações necessárias para o desenvolvimento da
pesquisa foi o questionário, que inicialmente foi organizado, em seguida foi
aplicado nas empresas e os resultados analisados posteriormente.
No
estudo de campo é analisada uma comunidade de trabalho, na qual as conclusões
das hipóteses são obtidas com a observação direta, entrevistando as pessoas
relacionadas com aquele determinado ambiente a fim de identificar as
ocorrências na comunidade.
As
questões elaboradas para o estudo de campo basearam-se nos fatores que impactam
na eficiência do processo produtivo relacionados a pré-ajustagem de ferramentas
(quadro 1) e em características da empresa relacionadas ao tipo de serviço
prestado e o segmento que fornece seus serviços.
O
questionário foi desenvolvido no programa computacional SurveyMonkey®,
que possibilita a criação de questionários dinâmicos, gerando gráficos e
relatórios, e auxiliando na análise dos dados.
Para
o questionário foram definidas nove (9) questões, das quais sete (7)
utilizaram-se da escala tipo Likert de
5 pontos para mensurar o grau de concordância dos sujeitos que responderam os
questionários.
Por
se tratar de um estudo de campo, o questionário elaborado (quadro 2) foi
aplicado diretamente na empresa para a validação das respostas, e os
respondentes estavam diretamente envolvidos com o processo pesquisado, sendo
estes, gestores, supervisores e encarregados da produção.
Para
a presente pesquisa foram selecionadas dez (10) empresas respondentes, sendo que
o critério da seleção foi que a empresa realizasse o processo de pré-ajustagem
de ferramentas de forma manual.
Resultados e discussões
A seguir serão apresentados os resultados e discussões
dos dados obtidos no questionário aplicado nas empresas estudadas.
A figura 1 aborda os tipos de serviços de usinagem que as
empresas prestam, das quais 10 % das empresas prestam serviços de produção seriada,
50 % das empresas prestam serviços de ferramentaria e 40% das empresas prestam
serviços de moldes e matrizes.
A figura 2 apresenta os segmentos para os quais as empresas fornecem seus serviços. Nesse caso, a pergunta foi aberta, com possibilidade de mais de uma resposta (segmento) pelas empresas. Das 10 empresas pesquisadas 80% são atuantes no setor automotivo, 10% são atuantes no setor duas rodas, 10% são atuantes no setor agrícola, 30% são atuantes no setor de eletrodomésticos (linha branca), 10% atuantes no setor de extrusão de alumínio, 10% atuantes no setor de embalagens, 20% atuantes no setor de embalagens de cosméticos, 10% atuantes no setor de máquinas ferramenta e 10% atuantes no setor siderúrgico.
A figura 3 apresenta o impacto da pré-ajustagem de ferramentas manual no tempo de setup. Entre os respondentes, as opções de respostas: discordo totalmente e discordo não foram assinaladas, 10% não concordo nem discordo, 60% concordo e 30% com a opção de concordo totalmente. Os resultados obtidos ratificam os das pesquisas realizadas, que apresentam que a pré-ajustagem de ferramentas feita manualmente impacta de forma relevante no tempo de setup.
Para a identificação sobre a influência dos aspectos
humanos no processo de pré-ajustagem de ferramentas foi questionado se a
experiência dos operadores interfere no resultado da pré- ajustagem manual
(figura 4). Após a aplicação do questionário, as respostas discordo totalmente,
discordo e não concordo nem discordo não foram respondidas, entre as 10
empresas, 40% concordam e 60% concordam totalmente. Informações estas que vão
ao encontro dos resultados obtidos por, na qual a experiência do
operador realmente afeta no resultado da pré-ajustagem.
Com o objetivo de analisar possíveis falhas do operador
houve o questionamento se ocorrem erros causados por inserção manual de valores
durante a operação de pré-ajustagem e a frequência destas ocorrências. Das 10
empresas, não houve a identificação de nunca ocorrem, 20% identificaram que
ocorrem raramente, 50% identificaram que ocorrem às vezes, 30% identificaram
que ocorrem muitas vezes e nenhuma empresa identificou que ocorrem sempre
(figura 5). Estes resultados corroboram com a pesquisa apresentada por, na
qual evidencia a ocorrência de erros manuais na inserção manual de valores,
interferindo assim na confiabilidade e segurança do processo produtivo.
Ainda analisando a interferência do operador na
pré-ajustagem de ferramentas manual, foi questionado qual a frequência das
ocorrências de quebras ou lascamentos de ferramentas durante esta operação
(figura 6). Nenhuma das empresas assinalou a frequência como nunca, 70%
assinalaram como raramente, 20% assinalaram como às vezes, 10% muitas vezes e
nenhuma assinalou como sempre. Estes resultados asseguram a interferência do
operador no processo também evidenciada por ocasionando aumento do
tempo improdutivo e do custo do processo.
Os problemas dimensionais, relacionados ao surgimento de
degraus de usinagem na superfície das peças produzidas, devido a falhas na
operação de pré-ajustagem manual foram evidenciadas por Para
corroborar estas informações, foi questionado às empresas a frequência da
ocorrência de degraus de usinagem no processo, sendo que nenhuma afirmou que os
erros nunca ocorrem, 30% afirmaram que os erros raramente ocorrem, 40%
afirmaram que os erros ocorrem às vezes, 10% afirmaram que os erros ocorrem
muitas vezes e 20% afirmaram que os erros sempre ocorrem (figura 7), resultados
estes, que confirmam as informações das pesquisas apresentadas.
A figura 8 aborda a frequência da ocorrência da
compensação das medidas das ferramentas após a pré-ajustagem. Entre as empresas
pesquisadas, não houve a resposta que nunca ocorrem, o percentual de 30%
responderam que raramente ocorrem, 40% responderam que às vezes ocorrem, 10%
responderam que muitas vezes ocorrem e 20% que sempre ocorrem. Estes resultados
apresentam relação com os obtidos por, que apresenta que compensação das
medidas após a pré-ajustagem das ferramentas interfere diretamente no tempo
produtivo do processo.
A figura 9 apresenta a frequência das ocorrências de
refugos de peças por falhas na pré-ajustagem das ferramentas. Neste caso,
nenhuma das empresas respondeu que nunca ocorrem, 70% responderam que raramente
ocorrem, e 30% responderam que às vezes ocorrem. Estes resultados se relacionam
com pesquisas desenvolvidas por, que apresentam que estas ocorrências
interferem diretamente no tempo improdutivo e no custo do processo produtivo.
Como pode ser observado nos resultados apresentados, o
uso da técnica manual para a pré-ajustagem de ferramentas, segundo os
respondentes das empresas, tem relação direta com o aumento do tempo
improdutivo do processo, no aumento do custo de produção, bem como na
confiabilidade e segurança do processo.
Durante a aplicação do questionário nas empresas, ficou
evidente o reconhecimento dos respondentes das empresas, em especial gestores e
supervisores da produção, que o resultado confiável da pré-ajustagem manual,
minimizaria os efeitos do aumento do tempo improdutivo do processo, no aumento
do custo de produção, bem como na confiabilidade e segurança do processo, está
relacionada diretamente com a experiência do operador.
Entretanto, mesmo nas empresas que relataram durante a
pesquisa de campo que todos os operadores eram experientes, pode-se observar
nas suas respostas que também sofriam com os problemas e limitações
apresentados, tendo em vista a dinâmica do processo produtivo na qual exige,
dos operadores, velocidade de produção e qualidade do serviço, o que interfere
muitas vezes na atenção e sensibilidade do operador durante a operação de
pré-ajustagem de ferramentas.
Uma forma de minimizar a interferência do processo de
pré-ajustagem de ferramentas nos custos do processo produtivo é o uso de
sistemas externos ou internos de pré-ajustagem de ferramentas. Devido a
automatização do processo de medição das ferramentas, o uso destes sistemas
possibilita minimizar a interferência do operador no processo de medição,
reduzindo assim o tempo improdutivo e aumentando a confiabilidade da medição e
consequentemente do processo.
Considerações Finais
Com base nos objetivos propostos, diante da pesquisa
aplicada conforme a metodologia definida e dos resultados obtidos, pode-se
concluir que:
a) O uso do método manual para a
operação de pré-ajustagem de ferramentas influencia diretamente no aumento do
tempo improdutivo, conforme apresentados nas figuras 3, 7 e 8;
b) O uso do método manual para a
operação de pré-ajustagem de ferramentas provoca aumento no custo de produção,
conforme apresentados nas figuras 6 e 9;
c) O uso do método manual para a operação de pré-ajustagem de ferramentas interfere na confiabilidade e segurança do processo, conforme apresentados nas figuras 4 e 5.
Adicionalmente, sugere-se como pesquisas futuras,
identificar quantitativamente o que o aumento do tempo improdutivo, o aumento
no custo de produção e a interferência na confiabilidade e segurança do
processo, gerados pelo método manual de pré-ajustagem de ferramentas,
representam no custo total do processo produtivo de uma empresa de usinagem.
Agradecimentos
Ao
Programa de Apoio à Pesquisa de Iniciação Cientifica (PAPIC) das Faculdades
Integradas Einstein de Limeira pela bolsa de Iniciação Científica de um dos
autores.
Tags
pré-ajustagemferramentasproduçãoCompartilhe
Ivan Correr
Engenheiro de Controle e Automação pela UNIMEP – Universidade Metodista de Piracicaba (2004) e Mestre em Gerência da Produção pela UNIMEP (2006). Atualmente é coordenador de P&D da empresa GeoTecno Soluções em Automação para o setor industrial.