Não há dúvidas de que empreender significa correr riscos.
Assim, ao se constituir uma
empresa, o empreendedor deverá se atentar para o fato de que será responsável pelos
atos praticados por esta, na medida em que todas as pessoas que exercem
atividade empresarial estão sujeitas a sofrer algum tipo de prejuízo.
Nessa
seara, veio o legislador e criou o instituto da limitação da responsabilidade
dos sócios, justamente para que estes pudessem ter alguma garantia de proteção
patrimonial, fomentando a atividade empresarial que, como se sabe, é a grande
responsável por fornecer produtos e serviços essenciais para a vida em
sociedade.
Conforme entendimento do doutrinador Fábio Ulhoa Coelho, “A partir da afirmação do postulado jurídico de que o patrimônio dos sócios não responde por dívidas da sociedade, motivam-se investidores e empreendedores a aplicar dinheiro em atividades econômicas de maior envergadura e risco.
Se não existisse o
princípio da separação patrimonial, os insucessos na exploração da empresa
poderiam significar a perda de todos os bens particulares dos sócios,
amealhados ao longo do trabalho de uma vida ou mesmo de gerações, e, nesse
quadro, menos pessoas se sentiriam estimuladas a desenvolver novas atividades
empresariais. No final, o potencial econômico do País não estaria
eficientemente otimizado, e as pessoas em geral ficariam prejudicadas, tendo
menos acesso a bens e serviços”.
No Brasil, as Leis 10.406/2002 (Código Civil) e 6.404/76 (Lei das Sociedades por Ações) são as grandes responsáveis por regulamentar a responsabilidade dos sócios nas empresas. Conforme o art. 1.051 do Código Civil, na sociedade limitada a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas quotas, mas todos os sócios responderão solidariamente pela integralização do capital social.
Portanto, a regra geral no tocante às sociedades limitadas é a de que os sócios
não responderão pelas dívidas da sociedade com seus bens pessoais, tendo assim
seu patrimônio pessoal protegido pela limitação da responsabilidade.
Na mesma
linha, conforme o art. 1º da Lei das S/A, na Sociedade Anônima a
responsabilidade dos acionistas será limitada ao preço de emissão das ações
subscritas ou adquiridas.
Para que ocorra a responsabilização pessoal dos sócios por dívidas trabalhistas, é necessária a figura da Desconsideração da Personalidade Jurídica, que nada mais é do que a suspensão da autonomia patrimonial da empresa para um determinado fato.
Assim, para que seja possível
responsabilizar os sócios juntamente com a empresa, é necessário que tenha
havido abuso da personalidade jurídica, por desvio de finalidade ou confusão
patrimonial. Verifica-se, portanto, que se o sócio utiliza-se da empresa para
negócios alheios ao seu fim ou faz confusão com o seu patrimônio pessoal e o da
sociedade, poderá vir a responder com seus bens pelas dívidas ou condenações
que a sociedade venha a contrair.
Todavia,
já há entendimento jurisprudencial no sentido de não responsabilizar os sócios minoritários
por dívidas trabalhistas. De acordo com recente decisão da 2ª Turma do Tribunal
Regional do Trabalho da 1ª Região, a desconsideração da personalidade jurídica
não deve alcançar os acionistas minoritários sem poder de gestão.
Em
análise processual, a Juíza de primeiro grau, ao constatar que a empresa não
possuía bens suficientes para quitação do débito contraído, deferiu a
desconsideração da personalidade jurídica para responsabilizar três acionistas
da sociedade. De acordo com a decisão, o sócio minoritário deveria igualmente
responder pela dívida trabalhista, pois, além de ter direito a voto dentro da
sociedade, foi beneficiado pelo trabalho do empregado.
Em sede de recurso, a procuradora do sócio minoritário alegou
que este deveria ser isentado de tal resposabilidade uma vez que: 1º não participava
na administração da sociedade anônima e 2º que havia firmado acordo com os
outros acionistas, no sentido de eximi-lo de qualquer passivo trabalhista.
Em
segunda instância, a Turma decidiu por afastar a desconsideração da
personalidade jurídica para o sócio minoritário, argumentando que esse tipo de
acionista na maioria das vezes está completamente alheio ao controle da
empresa, e que responsabiliza-lo seria “subverter todo o sistema empresarial e
financeiro do País, responsabilizando indiscriminadamente acionistas por
débitos trabalhistas de sociedades anônimas”.
Portanto,
percebe-se que a jurisprudência, em harmonia com a legislação vigente, entendeu
que o sócio somente virá a responder com seu patrimônio pessoal se for
verificada fraude nas atividades empresariais, por sócio com poder de controle
e gestão dentro da empresa. Caso contrário, as dívidas contraídas pela empresa
não poderão recair nos bens pessoais de seus sócios.
Percebe-se,
assim, que a legislação foi criada com o intuito de beneficiar o empreendedor
de boa-fé, estimulando o desenvolvimento de novas atividades empresariais e
contribuindo, assim, com o crescimento da economia nacional, no que é dever de
cada empreendedor, antes de constituir ou se associar a uma empresa, ter
conhecimento de seus direitos e deveres, garantindo assim a proteção e
resguarda de seus interesses.
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Bárbara Meira de Souza
Advogada societária na Schramm Hofmann Advogados Associados.