Um bom negociador tem alta capacidade de percepção em relação ao comportamento alheio
Negociamos o tempo todo nas mais diversas situações, no entanto, este processo tem se acelerado em razão de vivermos em ambientes cada vez mais relacionais, dinâmicos e competitivos, o que exige novos aprendizados na arte de negociar.
Ambientes competitivos, em geral, não são muito equânimes e coerentes e, embora você seja um exímio negociador, o seu sucesso não dependerá unicamente de algumas habilidades, pois variáveis contextuais poderão dificultar determinado objetivo.
A ética, quase sempre, é fragilizada quando o ambiente é altamente competitivo e isto tem ligação direta com a negociação. Grandes corporações detêm poderes que podem desestabilizar o chamado processo “ganha a ganha” e trazer prejuízos às empresas menores ou pouco competitivas neste sentido.
Este cenário faz com que organizações dos mais diversos segmentos sucumbam em razão de negociações que trazem prejuízos. O outro lado pode ter forças extraordinárias que dificultam um senso relativo. Há um discurso social e algumas vezes enganoso de busca pela convergência de interesses, mas a realidade é outra, observamos inúmeras situações divergentes impostas por um mercado ameaçador.
Frases de efeito e utopias extravagantes acompanham o dia a dia organizacional e isto também acontece de forma impactante no processo negocial. Difícil de compreender mesmo é a fraca percepção em relação à realidade das coisas. Toda esta celeuma observada em nosso ambiente dificulta nossa competitividade e nos cega em relação a determinados fatores.
Embora tenhamos uma realidade bastante diferente dos discursos utópicos, vamos a algumas análises em relação à negociação. Elas não deixam de ser importantes, no entanto, precisamos aprender a ver as entrelinhas deste emaranhado competitivo e altamente complexo.
Abordarei neste artigo situações pouco discutidas, no entanto, de grande valor para as pessoas que precisam conhecer um pouco mais sobre negociação.
Questões Emocionais
“Descobrimos mais sobre a mente humana nos últimos cinco anos, do que nos cinco mil anos anteriores de história da humanidade”. Esta frase é de Steve Pinker, professor de Neurociência de Harvard e autor do livro “Como a Mente Funciona”. É uma frase de grande impacto e nos faz refletir sobre todas as nuances da vida, tanto social, como também organizacional.
A neurociência tem trazido questionamentos em relação a verdades até então consideradas absolutas. As descobertas são variadas e algumas desalentadoras. Algumas delas são altamente impactantes, ao afirmar que grande parte do que somos é genético e que determinadas competências como criatividade, capacidade de liderança, resiliência, extroversão, entre outras, são estruturais e não são desenvolvidas porque simplesmente queremos, ou ainda, podem ser mais desafiadoras do que imaginávamos até então.
O mesmo fenômeno acontece em relação às competências necessárias para negociar. Algumas pessoas têm naturalmente uma facilidade maior para isto, outras nem tanto. Cabe àqueles que não as possuem, buscar ajuda de profissionais mais orientados para o exercício desta função. Neste ínterim vale lembrar a frase de Steve Jobs: “Foque naquilo que você é bom e delegue o resto”.
Percepção
Um bom negociador tem uma alta capacidade de percepção em relação ao comportamento alheio. Observa sinais subliminares de satisfação em relação a determinada oferta e fica atento aos mínimos detalhes comportamentais. Henrik Fexeus aborda o tema em seu livro “Como Interpretar Gestos e Influenciar Pessoas, Sem Que Elas Percebam.
A negociação é um fator crítico de sucesso e embora pareça uma atividade baseada em técnicas, ela depende substancialmente de aspectos socioemocionais como comunicação não verbal, linguagem corporal, comunicação subliminar, influência psicológica e inteligência emocional.
Visão Romanceada
Assim como temos uma visão romanceada sobre liderança, capacidade de criatividade, resiliência, controle emocional e tantas outras competências, também temos a mesma percepção em relação à capacidade para negociar. Como exemplo, em geral, pessoas que são líderes, além de comportamentos positivos possuem também características como egoísmo, vaidade, dificuldade para ouvir, centralização e inúmeros outros comportamentos que nada tem a ver com o que ouvimos e lemos por aí.
Não sei por que insistimos em não ver a verdade do jeito que ela é. Livros e mais livros são escritos e abordam a liderança como se fosse um romance água com açúcar. Uma frase chavão que permeia o mundo organizacional é de que o líder precisa ser um exemplo. A realidade é outra em inúmeras situações. Não por acaso, os liderados vivem reclamando do comportamento de seus líderes e muitos trocam de empresas exatamente porque não aguentam mais conviver com pessoas tão complicadas.
No processo de negociação percebemos situação semelhante. Romanceamos e simplificamos esta atividade e propagamos aos quatro ventos que o objetivo final do ato de negociar é uma situação “ganha a ganha”. Em relação a isto cabem algumas perguntas simples: “No mundo hipercompetitivo, algumas grandes corporações realmente vivenciam esta prática? Você tem uma sensação de tranquilidade quando vai negociar ou vai preparado para um processo altamente estressante, que mais parece uma guerra, dada a medição incessante de forças? Há interesses reais da outra parte na sua próspera sobrevivência ou você tem a sensação de que se não cuidar estará ameaçando o seu negócio?”
Obviamente não posso deixar de comentar aqui que sempre existem exceções. No entanto, um ambiente de alta competição aflora nossos instintos primários e eles não são tão bonzinhos assim. Um autor que aborda este tema com grande primazia é Richard Dawkins, em seu livro “O Gene Egoísta”. De início, para aprendermos um pouco mais sobre negociação, precisamos primeiro saber mais sobre o comportamento do ser humano, pois é com ele que negociamos o tempo todo.
Comunicação não Verbal
Nossa pupila se dilata quando estamos satisfeitos ou algo nos faz feliz. No processo de negociação, ao ouvirmos uma oferta positiva e que venha ao encontro de nossas expectativas, nossos olhos irão nos entregar. Os orientais ficam totalmente atentos e conseguem perceber isto com grande facilidade, motivo pelo qual são considerados hábeis negociadores.
É salutar esclarecer que as informações subliminares são captadas pelo nosso inconsciente na maioria das situações. Nosso corpo reage positivamente aquilo que gostamos. É muito fácil perceber o nível de adesão e concordância simplesmente olhando para o movimento do corpo da pessoa com quem estamos negociando. Cruzar os braços no momento de uma oferta demonstra discordância. Outras maneiras de comportamento como gestos faciais e determinadas formas de olhar também trazem uma carga incrível de comunicação subliminar.
Podemos aprender sobre isto, no entanto, determinadas pessoas possuem naturalmente o dom de perceber gestos não verbais. Em geral, os seres relacionais, aqueles que possuem um perfil mais orientado aos aspectos humanos do que técnicos, têm naturalmente uma capacidade maior para descobrir o que se passa na cabeça das outras pessoas. Os gestos revelam.
Proxêmica
O termo proxêmica – proxemics, em inglês, foi criado em 1963 pelo inglês Edward. T. Hall – Antrópologo. É o estudo das distâncias físicas que as pessoas estabelecem espontaneamente no convívio social.
Assim como outras criaturas, o ser humano tem necessidade instintiva de demarcar seu território. Desenvolvemos objetos e formas de marcação de território, e mantamos este espaço dividido, cercado, marcado. Invadir é sempre um ato de agressão.
Na negociação é preciso ficar atento ao espaço que a outra pessoa nos concede. Se nos aproximamos ou nos distanciamos demais, podemos prejudicar o relacionamento e a comunicação com o outro.
Observe atentamente as reações e se afaste quando perceber qualquer desconforto na aproximação. Se houver oportunidades e perceber que isto é favorável, chegue um pouco mais perto. Cuide sempre para não ser inconveniente.
Fique atento ainda aos aspectos culturais. Os latinos aceitam contatos mais próximos, já os alemães e ingleses gostam de um pouco de distância e por este motivo, esticam mais os braços ao cumprimentar. Japoneses, coreanos e outros povos orientais não gostam de toques e preferem uma breve inclinação com o corpo. Poderíamos citar ainda outros cuidados que podem ser observados no livro “O Macaco Nú”, de Desmod Morris.
Mesa Redonda
“Quem senta na ponta da mesa, paga a conta”. Pessoas que detêm o poder em encontros sociais ou empresariais, sentam-se na ponta da mesa, sempre de costas para a parede e nunca de costas para a porta de entrada. As mesas retangulares possuem uma posição privilegiada que denota poder e por este motivo, devem ser evitadas nos processos de negociação.
Quando o rei Arthur criou a távola redonda, seu objetivo era demonstrar igualdade entre todos os presentes. O rei e os cavaleiros tinham o mesmo valor. Por este motivo, procure sempre negociar em mesas redondas que dão uma conotação de igualdade de forças.
Olhar
Uma das formas de demonstração de poder entre a raça humana e muitos outros mamíferos é a força do olhar. Pessoas mais humildes olham menos para aqueles que são mais fortes. Arrogantes possuem um olhar alto e aqueles extremamente inseguros evitam ao máximo um olhar mais direto. Ao negociar com outra pessoa, cuide para não demonstrar sinais de vaidade, orgulho excessivo e confiança em demasia e também de insegurança. Um olhar inadequado pode acabar com suas vantagens competitivas numa mesa de negociação.
Não fixe seu olhar no olho de outra pessoa por muito tempo. Ao contrário do que muitos alardeiam, olhar fixamente é próprio de quem desafia. Fixe seu olhar no olho de quem está a sua frente por alguns segundos e em seguida observe outras partes do rosto ou o espaço ao redor. Cuide para que haja uma sintonia de olhares.
Mãos
O aperto de mão é uma das formas de toque própria dos seres humanos. Temos apertos demasiadamente exagerados que podem demonstrar falsidade; possessivos, que forçam a outra pessoa a lhe mostrar a palma da mão; indiferentes, que não são seguidos de um olho a olho de dois a três segundos e aqueles considerados mais verdadeiros e positivos.
O cumprimento é um abraço de mãos. Nem tão violento, nem tão frágil, mas sim, na medida certa. Lembre-se disto quando encontrar a pessoa com quem você vai negociar. Mostre segurança, verdade e amabilidade num simples e firme aperto de mão. Agindo desta forma, você já deu um bom primeiro passo.
As mãos também comunicam sensualidade, força, proteção, submissão e franqueza. Perceba os movimentos das mãos dos grandes líderes. Veja a grande força comunicativa que demonstram e utilize este recurso para atuar positivamente em uma negociação.
Comunicação Motriz
Pessoas felizes se movimentam mais, falam mais alto, são mais entusiastas e permitem uma comunicação mais próxima e calorosa. As manhãs de segundas-feiras são mais silenciosas nas empresas e as tardes de sextas-feiras mais festivas, pois pessoas felizes são mais dinâmicas em suas falas e gestos. Ao negociar observe o nível de entusiasmo da outra parte e veja qual o nível de alegria, força de expressão e movimentos que você pode demonstrar.
Almoço e Jantar
É comum que muitos executivos agendem um almoço ou jantar de negociação. Não cometa erros primários nestes ambientes e fique atento em relação ao restaurante ideal para estes encontros. Evite escolher locais muito barulhentos ou que sejam inadequados às exigências e perfil de seu convidado.
Escolha uma mesa onde haja menos interrupção de garços e pessoas entrando e saindo. Deixe a pessoa com quem você vai negociar sentir que ela está no comando da situação. Permita que ela tenha uma visão geral do ambiente para que possa se sentir mais confiante e você, preferencialmente, fique de costas para área de maior movimento. Agindo deste jeito você conseguirá ficar mais concentrado na pessoa com quem irá negociar.
Roupas, Perfumes e Batons
Atente para não se vestir de forma errada. Busque informações para saber se a pessoa com quem você vai negociar é formal ou informal. As mulheres devem ficar alerta para não usarem roupas muito extravantes ou exageradamente sensuais (a não ser que a situação permita).
Não abuse de perfumes e adereços. Lembre-se que algumas pessoas são muito conservadoras. Batons vermelhos aguçam a sensualidade. Quando as mulheres estão receptivas sexualmente seus lábios ficam intensamente ruborizados em razão do aumento do fluxo sanguíneo. Ao usar batom a mulher deixa esta mensagem subliminar demasiadamente aparente e nem sempre isto é conveniente. Cabe a cada um avaliar a situação.
Agressividade
Evite ao máximo situações de agressividade, todavia, se isto acontecer, saiba como reagir. Em primeiro lugar é importante que você não interrompa uma pessoa agressiva. Deixe ela desabafar e somente depois faça as suas argumentações. Outro item importante é evitar tocar na pessoa que está emocionalmente abalada. Qualquer tipo de toque provoca reações mais violentas nestes momentos.
Outro fator primoridal a se observar é a palidez e a ruborização do rosto de quem você está negociando. É comum que nestes momentos os instintos primários dominem nossas emoções. Quando a outra pessoa fica com o rosto mais vermelho, ela está nervosa ou com raiva, mas ainda está no controle de suas emoções. Ao ficar pálida é um sinal de que grande parte do sangue que corria em seu cérebro e face se desloque para á area do tronco e dos braços preparando a pessoa para o ataque. Se isto acontecer se afaste imediatamente ou você poderá ser verbalmente e até fisicamente agredido.
O Nosso Corpo Fala
A negociação é um processo corriqueiro no dia a dia das organizações, independentemente de tamanho. Precisamos estar preparados para esta desafiadora atividade.
Até este momento evitei falar de técnicas de negociação. Para mim, elas sempre soam como receitas mágicas que muitas vezes não funcionam como esperamos. Negociar é uma habilidade que exige muito improviso. Não consigo planejar todas as prováveis situações que possam acontecer. Pensando desta forma posso afirmar que e preciso ter inteligência de negociação e não somente a técnica.
Tentei abordar o assunto sob outro prisma. Não aquele que encontramos com facilidade em livros acadêmicos ou em artigos na internet. Mas também sei que nossas mentes são preguiçosas. Algumas mais outras menos. Se estamos num ambiente confortável tentaremos permanecer nele e evitamos a mudança.
A percepção em relação a outra pessoa é fundamental nas relações humanas e nosso corpo é um grande celeiro de informações que são fundamentais para as atividades humanas. Fique atento ao que o corpo fala, em geral, eles comunicam mais do que as palavras.
Para agradar a gregos e troianos segue uma lista básica. Grande parte das pessoas prefere dicas, mas é bom lembrar que elas não são mágicas. Conhecer com profundidade, sempre é mais seguro.
8 Dicas para Melhorar a sua Negociação
1 – BUSCA DE FATOS E DADOS
Ao negociar tenha em mãos dados suficientes para que você não faça concessões indevidas. Veja até onde você pode ceder, sem que haja prejuízos para você ou sua empresa. Tenha em mãos informações concretas, dados, valores, planilhas e todo o material que possa de alguma forma contribuir e deixar você bem armado.
2 – ESCOLHA DO LOCAL
Se for possível, escolha um local que seja o mais positivo possível para que você possa se sentir a vontade. Se a escolha do local estiver sob seu controle, opte pela negociação em sua empresa.
3 – SAIBA OUVIR
Falar nem sempre é mais vantajoso. Tente ouvir com atenção as informações, fique atento aos dados fornecidos pela outra pessoa e vá pensando nas possíveis argumentações. Não interrompa, ouça até o final. Isto vale tanto para negociações presenciais como também por telefone, skype etc.
4 – OBSERVE A LINGUAGEM NÃO VERBAL
O corpo fala e revela emoções. Não ouça somente as palavras e veja as reações positivas e negativas daquilo que você está expondo.
5 – PLANEJE
Faça um planejamento da negociação. Observe possíveis cenários, estude o assunto e obtenha informações da outra parte. Se precisar de ajuda, faça isto.
6 – EVITE O CONFLITO
Tente chegar a um resultado que seja positivo para os dois lados, sem provocar um conflito. Se for necessário, marque uma segunda ou terceira rodada de negociação.
7 – NÃO FAÇA CONCESSÕES INDEVIDAS
Lembre-se de que a negociação precisa ser positiva também para você e para sua empresa. É comum que as pessoas façam concessões que são prejudiciais ao negócio em momentos de instabilidade ou insegurança.
8 – REFORCE AO FINAL O QUE FOI NEGOCIADO
Para não haver dúvidas, repita, ao final da reunião, os tópicos principais e formalize o que foi acordado.
Negociar é uma habilidade de elevada importância. Busque mais informações sobre esta importante atividade para o seu dia a dia e seu negócio.
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Pedro Luiz Pereira
Professor, consultor, executivo da ABINFER e sócio proprietário da EURHO Consulting. Especialista em Neurociência e Neurocoaching, MBA em Gestão da Qualidade e Produtividade e em Gestão de Pessoas. Autor do livro “Tomada de Decisão e Negociação”.