Nos últimos anos tenho visto comentários de ferramenteiros do tipo:
Não somos mais valorizados!
Nós, os mais velhos, estamos sendo deixados de lado!
Agora que os computadores chegaram, não temos mais valor!
Não dá mais... hoje em dia só maquinas têm valor! Vou vender
pastel na esquina, que eu ganho mais!
Toda indústria metal mecânica esta passando por transformações
rápidas e impactantes e, o ferramenteiro não poderia permanecer
sem ser atingido.
Brasil, inicio da década de 70, ferramenteiros eram
"Monstros Sagrados" da mecânica!
Eram donos do conhecimento, da habilidade e dos processos de fabricação. Cálculos de trigonometria fluíam fáceis através de tabelas e simples calculadoras de soma e multiplicação desvendando caminhos para usinagens complexas feitas com gabaritos, apoios e inclinações mirabolantes.
Bíblia sagrada do mecânico
Obras de Arte saiam de maquinas convencionais.
Suas mãos, habilidosamente, empunhavam ferramentas e
articulavam dispositivos para usinagem manual e ajustes complexos entre partes
fixas, aderentes ou moveis, apenas com o sentimento do tato ou olhar.
Como era prazeroso ver pequenas esculturas geométricas sendo lapidadas manualmente e, ver o Mestre, empunhar sua arte em direção à luz, (como se clamasse pelos deuses da mecânica), para medir - pela possível fresta - o resultado de seu trabalho, era algo de arrepiar!!
Projeto, planificação, blueprint era coisa complexa que aos olhos do ferramenteiro demandava tempo "inútil".
Ferramenteiros podiam idealizar o ferramental em rascunhos
executados em pedaços de papel, construindo passo a passo cada parte, fixa ou
móvel de qualquer complexidade com equipamentos que hoje seriam rudimentares,
mas de extrema precisão.
Eram quase Deuses...
Mas o tempo, implacável tempo...
A evolução - mestra da criação e inovação - clamou por mais,
e mais rápido.
A arte começou a ser segmentada. Auxiliares, também artistas, começam a se destacar ao ajudar: Ajustador ferramenteiro, Torneiro ferramenteiro, Fresador ferramenteiro e o Ferramenteiro ficava com a importância de reunir e ajustar os componentes, fazendo tudo funcionar.
No desenvolvimento, anos foram substituídos por meses, meses por semanas e semanas por dias. Como continuar a se valer das mãos, dos sentidos, dos cálculos apoiados em tabelas se os recursos disponíveis são outros. A maquina ganha novos recursos e já é suportada por computadores.
Ambientes matemáticos são facilmente criados em computadores cada vez mais acessíveis permitindo simulações e criações mirabolantes, quase sem custo e com períodos reduzidíssimos em qualquer lugar do planeta através do uso da internet.
Você consegue imaginar quanta tecnologia facilitadora está a caminho? Pequena amostra.
Não seria Normal se os Mestres, - quase Deuses -, aceitassem
tudo isto passivamente. Relutam, tentam manter sua importância no processo
frente a uma avalanche de jovens desconhecidos e inexperientes!
No Brasil, em algumas empresas, a facilidade de acesso a recursos computacionais e informações na internet tornou o trabalho muito superficial. Não há reflexão, não aprofunda-se nas decisões. É como se tudo fosse barato: errou, apaga-se, (deleta-se).
Algo novo a fazer, copia-se (Control-C/Control-V) e tudo vai ficando igual, mediocremente, igual! O conhecimento esta banalizado! Por esta facilidade não veem necessidade de consultar os mais antigos, os Mestres. O conhecimento se perde!
Os "Monstros Sagrados", referenciá-los ou
exterminá-los?
A evolução é massacrante e quem não se adapta a ela, é
exterminado. Isto é fato!
A historia mostra que as maquinas a vapor, a mecanização chegaram para substituir a mão de obra intensiva no campo, nas industrias e gerações de trabalhadores não sumiram, mas precisaram adaptar-se com novos empregos, novas atitudes frente ao trabalho e, principalmente, estudando adquirindo novos conhecimentos.
Conheço antigos ferramenteiros que trocaram a capa azul, as botas de segurança pela jaqueta bege, pelo terno, pelo jaleco branco de instrutor através da educação. Outros ficaram inertes, parados e esperaram para ser engolidos pela tecnologia. (espero eu não seja seu caso!)
À Industria falta o respeito por estes "Monstros
Sagrados"
A necessidade de redução de custo de mão de obra principalmente com a adoção de indicadores de desempenho exterminador de cabeças do tipo: Faturamento per capita, colocou uma venda nos olhos de gestores na década de 90 e inicio dos anos 2000, empurrando centenas de ótimos profissionais para fora do mercado, o que foi uma lastima!
Transformar os "Monstros" do passado em
"Monstros" do presente.
Uma crítica ao sistema.
Fácil perceber a quantidade de conhecimento tácito que foi despejado no lixo representando um enorme desperdício. Manter este conhecimento nas empresas passa pela simples ação de transforma-los em Mestres no Presente através da formação educacional para o compartilhamento de conhecimento.
Transforma-los em tutores ou mentores da Juventude Ingressante é um caminho simples e de retorno fácil podendo ser feito internamente com apoio do RH/ ou Gente e Gestão, mas que foi deixado de lado.
A era da Mão de Obra no Brasil está prestes a acabar, já
estamos na era da Mente de Obra!
Voltando ao inicio desta narrativa, o ferramenteiro atual retoma a importância pelo processo como um todo. Não com ação manual, mas sim com apoio em todas as etapas através de seu conhecimento!
Aos Monstros Sagrados cabe entender que o futuro já é presente, que sua habilidade manual deve ser trocada pela Habilidade Intelectual utilizando todo seu conhecimento em prol de ajudar aos mais jovens com sua vivencia e conhecimento.
O foco que era na montagem, no ajuste manual dever ser agora no todo: do projeto, no processo de fabricação à montagem procurando sempre eliminar trabalhos manuais e possibilitando que a finalização do ferramental seja através do trabalho de encaixar peças e aperto de parafusos. Simples assim!
A profissão de Ferramenteiro não esta acabando, ela está se
transformando: de um Único para um Todo! Continuar Contribuindo passa por este
entendimento!
Aos Jovens que chegam ao mundo da ferramentaria sugiro que
se aproximem e peçam que os "Dinossauros" contem historias,
certamente serão magnificas e um exemplo de adaptação e flexibilidade ao
fantástico mundo da mecânica!
Aos Monstros Sagrados que deixaram a indústria por qualquer
motivo: Um sincero Muito Obrigado!
Vocês foram extremamente importantes para a historia da
mecânica deste jovem País
Obrigado por ter chegado até aqui e, se gostou, compartilhe!
Sucesso!
Tem interesse por Ferramentaria? Confira mais reflexões minhas sobre o segmento.
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Industria Mecânica ferramentaria indústria mão de obra tecnologia profissão ferramenteiroCompartilhe
Luiz Carlos dos Santos
Gestor de Ferramentaria - 40 anos Passados para suporte ao Presente na construção do Futuro para a Industria de Injeção