

O maestro que rege a grande orquestra e faz com que todas as vozes
e instrumentos atuem em perfeita sintonia precisaequilibrar razão e emoção.
Com vocês, o CEO, mestre equilibrista entre o que pode e o que deve ser feito.
Nos dois primeiros
artigos da série para a Revista
Ferramental (publicados nas edições 73 e 74) tratamos do desafio colossal
que é fazer com que uma empresa familiar alcance a perenidade.
Discorremos sobre a
importância de planejar a sucessão, com a preparação cuidadosa dos candidatos e
sempre assegurando total liberdade de escolha aos integrantes da família
empresária para decidir se desejam ou não seguir os passos do fundador.
Nesse terceiro e
último artigo vamos falar de um profissional capaz de desempenhar um papel
chave na continuidade de negócios familiares.
Para compreender
melhor os benefícios que esse elemento pode agregar é preciso ter em mente o
modelo ideal de Governança Corporativa, uma estrutura composta por duas
pirâmides invertidas. A de cima acomoda o Conselho de Administração (ou
Consultivo), âmbito de participação dos acionistas, enquanto na de baixo se
insere a chamada Gestão, os executivos que trabalham no dia-a-dia da empresa.
Pois é exatamente entre as duas pirâmides que encontramos o tal profissional de
que estamos falando, quase como se fosse um equilibrista em um jogo de
malabares: o CEO.

Mas quais são as
atribuições dessa função definida por uma sigla em inglês que soa mais pomposa
do que deveria? Sabemos que o acionista precisa manter a atenção no longo
prazo, nas estratégias que indicam a direção a seguir e na sustentabilidade do
negócio. Ao Conselho de Administração cabe a responsabilidade de ser o guardião
dos princípios, valores e do próprio sistema de Governança da empresa, além de
oferecer um apoio estratégico. Pois bem, o CEO precisa fazer um pouco disso
tudo, além de outras tantas coisas mais.
Esse líder deve ter uma razoável capacidade de comunicação e carisma, porque terá que transmitir com clareza à sua equipe e aos demais funcionários da companhia o que espera que eles façam, de preferência acrescentando uma pitada de feitiço motivador.
Ele responde pelos resultados do negócio e ainda se espera que atue como uma
espécie de embaixador da organização, seja diante de clientes, representantes
da esfera pública ou investidores externos. Mas além dessas atribuições, nosso
equilibrista tem outra função determinante: servir como o grande intermediador
entre as esferas da Governança.
Não é à toa que ele aparece bem no meio das duas pirâmides do modelo ideal - está ali porque deve atuar como o principal filtro entre elas. O CEO tem um papel determinante na mediação dos contatos, demandas e questionamentos que partem de ambas as pirâmides.
Ele precisa estar atento para que problemas que dizem respeito
apenas aos acionistas não atinjam sua Equipe de Gestão ou o universo dos
funcionários, evitando insatisfações desnecessárias nessas esferas. Ao mesmo
tempo, é imprescindível que ele limite ao mínimo a intervenção da pirâmide
superior no dia-a-dia da inferior, para que seu time de gestores possa
trabalhar em paz e execute com tranquilidade as determinações estratégicas
definidas em conjunto com o Conselho de Administração.
Em uma empresa familiar um item extra adiciona complexidade à dinâmica, a convivência com os membros da família proprietária (tanto os que trabalham no negócio quanto os que gravitam ao redor dele). Nesse detalhe se apoia o ponto que defendemos: em empresas familiares a função do CEO pode ser exercida com muito mais eficiência por um profissional de mercado, que não tenha relações de sangue com a família proprietária.
Não temos a pretensão de afirmar que a função de diretor geral não possa ser desempenhada por um membro familiar com competência, há uma série de casos em que isso acontece com sucesso inquestionável. Nossa posição é radicalmente contrária à dos que pregam a “profissionalização” do negócio familiar a ferro e fogo, em que o afastamento da família da empresa é posta como condição elementar de sucesso.
Nós, pelo contrário, acreditamos que a integração é possível, seja no Conselho de Administração (como acionistas atuantes), ou mesmo como integrantes da Equipe de Gestão (desde que existam pessoas qualificadas para tanto).
Mas na posição do
equilibrista, que tem o papel de mediador e estabilizador, que precisa
funcionar como o grande filtro entre as esferas da Governança, uma série de
dificuldades adicionais se impõem quando relações de sangue estão envolvidas.
Um CEO familiar terá
mais dificuldade em manter um relacionamento equânime com outros integrantes da
família em posições relevantes, sejam estes acionistas ou membros do Conselho,
porque aos assuntos profissionais será sempre acrescentado um aspecto
emocional. Mais cedo ou mais tarde, esse indivíduo irá se deparar com conflitos
de interesse envolvendo integrantes ou ramos diferentes da família, e até antes
de tomar qualquer decisão ele vai sofrer com acusações (ainda que veladas), de
parcialidade.
Não é só diante dos
seus pares que o CEO familiar enfrenta problemas extras. No relacionamento com
a Equipe de Gestão ou com os funcionários da empresa ele será sempre visto como
um integrante da família proprietária, sob uma ótica distinta da puramente
profissional.
Imagine um momento em
que ele tenha que negociar o percentual de reajuste de uma categoria de
operários ou promover o corte de algum benefício salarial em razão da
necessidade de redução de gastos, por exemplo. Nessa hora a frase estará na
ponta da língua de alguns: “no tempo do seu pai era diferente...”.
Também no ambiente externo o CEO familiar tende a sofrer mais pressão do que um executivo comum. Os integrantes de um clã empresarial ocupam uma posição singular na comunidade em que vivem, especialmente em cidades de menor porte ou do interior.
Pensemos
no caso de uma empresa familiar que precisa fazer um corte considerável no seu
quadro de funcionários ou que esteja planejando a mudança de uma planta
industrial da região em que foi fundada para outra, onde encontrará condições
mais favoráveis. Como esse diretor geral familiar irá encarar essas decisões,
sabendo que depois terá de conviver com olhares enviesados na fila da padaria?
Mesmo embasado por motivações econômicas claras, será ele capaz de deixar a
emoção e o histórico da família de lado no momento de agir?
Um profissional de
mercado consegue lidar muito melhor com todas essas situações, justamente por
estar livre dos laços familiares. Independentemente de suas decisões, ele será
visto como uma pessoa qualquer, tanto pelo público interno quanto pelo externo
à organização, imune à “aura de dono” que cerca os membros familiares.
Obrigado aos que nos acompanharam até aqui. Esperamos ter contribuído de alguma forma para que os negócios familiares tenham vida longa e se perpetuem no Brasil.
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Bruno Luis Ferrari Salmeron
Diretor de Operações da Divisão Automotiva da Schulz S.A., vice-presidente do Sindipeças - Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores e coordenador do Capítulo de Santa Catarina do IBGC - Instituto Brasileiro de Governança Corporativa