Análise das deformações na região externa de chapas de aço LN 380 no processo de dobramento – Final

Após as avaliações pode-se concluir que, para o estudo em questão e condições pré-definidas - como deslocamento do punção, a variação dos ângulos e raios não interferiu significativamente no aumento ou diminuição do retorno elástico e nem na deformação na região de tracionamento do material durante o processo de dobra.

Em continuidade ao artigo iniciado na edição anterior, apresentamos um estudo de caso onde chapas de aproximadamente 6 mm de espessura foram analisadas através de ensaios de tração e dobramento afim de verificar as propriedades mecânicas do aço e detectar o nível de deformação nas fibras externas da chapa, bem como seu retorno elástico.

Metodologia

Material utilizado  

No desenvolvimento dessa pesquisa foi utilizado o aço de alta resistência e baixa liga (ARBL) LN 380. Esse material vem sendo largamente aplicado na indústria automobilística, especialmente na parte estrutural como chassis, longarinas, travessas, etc. 

Ensaio de tração 

Com o objetivo de obter as principais propriedades mecânicas do material em análise, foi realizado o ensaio de tração em chapas LN 380 com 6,35 mm de espessura. Através desse ensaio, é possível verificar características do aço tais como: tensão limite de escoamento, tensão máxima de resistência, alongamento e coeficiente de encruamento.

O ensaio foi realizado nas dependências do Laboratório de Transformação Mecânica (LdTM) da UFRGS e o equipamento utilizado foi uma máquina de ensaio universal da marca EMIC com capacidade de carga de 60 toneladas.

Os corpos de prova foram cortados em uma guilhotina e tiveram suas arestas desbastadas a fim de remover rebarbas que pudessem gerar pontos de concentração de tensões e interferir no resultado dos ensaios. Para o levantamento dos dados foram utilizados cinco ensaios válidos.

Considerou-se um comprimento inicial de 50 mm para que seu alongamento pudesse ser mensurado a partir de um extensômetro fixado na chapa conforme figura 8.

    



Dobramento livre 

O ensaio de dobramento foi realizado na mesma máquina EMIC utilizada para o ensaio de tração, porém o punção foi acoplado na garra móvel do equipamento como mostra a figura 9. Para a execução desse processo, baseou-se na norma DIN[1] EN ISO[2] 7438.

Figura 9 – Ensaio de dobramento livre do aço LN380

Os corpos de prova utilizados nesse ensaio possuíam as mesmas dimensões dos corpos de prova aplicados no ensaio de tração, ou seja, 250 mm de comprimento, 20 mm de largura e 6,35 mm de espessura.

Foram utilizados diferentes valores de raios de punção, sendo eles: r = 6mm, r = 9mm e r =12mm.

Conforme a tabela 3, alguns parâmetros fixos também foram adotados.

Tabela 3 – Parâmetros fixos no ensaio de dobramento

O avanço do punção em milímetros, ou seja, o deslocamento do punção, também foi pré-determinado conforme tabela 4 a fim de obter diferentes ângulos de dobra e detectar a partir de que ângulo o material começa apresentar falhas. Desse modo, possibilitando medir a máxima deformação na região externa da chapa. 

Tabela 4 – Parâmetros fixos no ensaio de dobramento

Segundo a tabela 4, o avanço do punção foi aumentado de 5 em 5 mm, mas não foram necessários os doze corpos de prova para cada raio definido, pois para os raios maiores (r = 6mm, r = 9mm e r =12mm) partiu-se do delocamento em que ocorreu trinca no raio menor. Sendo assim, 24 corpos de prova foram submetidos ao ensaio de dobramento, considerando as 3 variações do raio do punção.

Medição da deformcação de tração  

Antes das chapas serem submetidas ao ensaio de dobramento, todos os corpos de prova foram gravados com uma malha com círculos de diâmetro inicial  igual a 2,5 mm, através de um processo de corrosão, como mostrado na figura 10, para que após o ensaio fosse possível medir a deformação do material na região de tração através do alongamento do círculo impresso na chapa.

Figura 10 – Marcações realizadas em cada chapa

Medição do retorno elástico  

Para cada ensaio, o ângulo de dobra foi individualmente medido antes e após a retirada da carga de dobramento. Para isso, utilizou-se de um goniômetro.

Para que fosse possível calcular o retorno elástico, foi preciso medir o ângulo formado após cada deslocamento do punção e antes do descarregamento.

Resultados e discussões 


Ensaio de tração  

Os ensaios de tração foram realizados para conferir as propriedades mecânicas do material, tais como tensão de escoamento, tensão máxima e alongamento. Na tabela 5 estão listadas as principais propriedades mecânicas medidas do material estudado.

Tabela 5 – Propriedades mecânicas do LN380

Como pode ser observado na tabela 5, cinco corpos de prova foram submetidos ao ensaio de tração. Apenas o corpo de prova 2 (CP2) apresentou uma tensão de escoamento inferior em relação aos outros CPs, essa igual a 457 MPa, porém sua tensão máxima se iguala as do CP4 e CP5.

Pela mesma tabela observa-se também que o CP1 obteve a máxima tensão igual a 544 MPa e a mais elevada deformação relativa igual a 30,5%. No entanto, a média da tensão de escoamento, tensão máxima e deformação relativa foram de 469 MPa, 539 MPa e 28,6% respectivamente. O maior desvio padrão detectado refere-se a tensão de escoamento (kf).

A figura 11 representa a curva tensão convencional x deformação relativa para o aço LN 380 obtida a partir dos dados computados durante o ensaio de tração.


Através da figura 11, é possível verificar uma deformação relativa do aço de quase 30% e uma tensão de escoamento superior a 450 MPa. Já a figura 12 representa a curva tensão de escoamento x deformação verdadeira do LN 380. Nesse diagrama, a tensão máxima chega a ultrapassar 600 MPa.

Figura 12 – Curva tensão de escoamento x deformação verdadeira do aço LN380

Ensaio de dobramento 

O ensaio de dobramento foi realizado variando o raio do punção e o deslocamento do mesmo. Os diagramas apresentados pelas figuras 13, 14, 15 e 16 representam a curva força de dobramento x deslocamento do punção para raios e deslocamentos diferentes.

A partir da figura 13 verifica-se que para dobrar uma chapa de LN380 nas condições determinadas anteriormente, são necessários aproximadamente 6 kN.

Figura 13 – Diagrama força x deslocamento do punção até 40 mm e raio 6 mm


Igualmente apresentado na figura anterior, o diagrama da figura 14 mostra que a força de dobramento não altera significativamente variando o deslocamento do punção, ou seja, a força máxima necessária para um deslocamento de 45 mm permaneceu em torno de 6 kN. 

Figura 14 – Diagrama força x deslocamento do punção até 45 mm e raio 6 mm

Um comparativo entre os três diferentes raios de punção utilizados no dobramento é apresentado na figura 15, em que o punção desloca até 50 mm.

Figura 15 – Diagrama força x deslocamento do punção até 50 mm

Observa-se que para um raio de 6 mm a força necessária para executar a dobra é relativamente menor que para os outros raios, porém para os raios de punção 9 e 12 mm, a força medida foi praticamente a mesma.

Para um deslocamento do punção até 55 mm, a força de dobramento apresentou uma variação um pouco maior após 45 mm de deslocamento, mas a força máxima de dobra atingida pelos raios maiores permaneceu na mesma faixa.

Analisando a figura 16, percebe-se também que as chapas dobradas com raio 9 e 12 mm não conseguiram ter um alongamento uniforme até o final do percurso do punção.

Figura 16 – Diagrama força x deslocamento do punção até 55 mm

Esses corpos de prova apresentaram trincas ou romperam antes que o punção atingisse o deslocamento pré-determinado de 55 mm, como mostra a figura 17.

Figura 17 – Trincas geradas durante o ensaio de dobramento

Medição da deformação de tração

Após o ensaio de dobramento, os corpos de prova foram medidos através de uma régua com escala adequada para medir deformações. Os resultados para um dobramento com punção de raio r = 6 mm estão demonstrados na tabela 6.

Tabela 6 – Dados referentes a deformação de tração da chapa no dobramento com r de 6 mm

Analisando a tabela 6, nota-se que o alongamento varia de 2% a cada 5 mm que o punção avança no seu deslocamento. No entanto, o grau de deformação máxima (φ) medido foi de 0,26, sendo igualmente nas tabelas 7 e 8 para r = 9 mm e r = 12 mm, respectivamente.

Dos dados dispostos na tabela 6, os dois últimos corpos de prova testados (CP11 e CP12) excederam o critério de colapso de 20% pré-estabelecido, porém, não apresentaram trincas superficiais. 

Dessa forma, não foi possível obter o ângulo de dobra, uma vez que a máquina retirou a carga automaticamente antes que pudesse ser medido. Por consequência, o máximo alongamento e grau de deformação não foram listados, pois não seriam os valores reais da máxima deformação.

Como os ensaios de dobramento utilizando o punção de raio r = 6 mm começaram a apresentar incertezas a partir de 55 mm de deslocamento, para raios maiores como r = 9 mm e r = 12 mm realizou-se o mesmo procedimento a partir de 50 mm de deslocamento, já que estatisticamente a chapa não romperia com raio do punção maior que a espessura da chapa.

A tabela 7 apresenta os resultados encontrados para as condições de dobramento com raio do punção igual a 9 mm.

Tabela 7 – Dados referentes a deformação de tração da chapa no dobramento com r de 9 mm

É possível perceber pela tabela 7 que quando o punção avança mais que 50 mm, a chapa não atende mais os 20% do critério de colapso e, nesse caso, começam aparecer trincas superficiais. Sendo assim, a máxima deformação (φ) obtida na região das fibras externas da chapa, utilizando um raio de punção r = 9 mm foi de aproximadamente 0,26 e um alongamento de 32%.

Já para um punção com raio r = 12 mm, os resultados estão descritos na tabela 8.

Tabela 8 – Dados referentes a deformação de tração da chapa no dobramento com r de 12 mm

Da mesma forma que nas condições de dobramento anteriores, as chapas ensaiadas começam a apresentar trincas superficiais a partir de 50 mm de deslocamento do punção. Nesse caso, o máximo grau de deformação também foi em torno de 0,26 e alongamento de 32%. Uma vez que os corpos de prova CP4, CP5 e CP6 romperam ou apresentaram trincas, seus dados de deformação não foram considerados.

Medição do retrno elástico 

A tabela 9 expõe os ângulos de dobramento e ângulos após a retirada da carga no processo de dobra para um raio de punção r = 6 mm e deslocamento do punção variando de 45 a 55 mm. Foram validados três corpos de prova para cada condição de ensaio.

Tabela 9 – Resultados do ensaio de dobramento para um raio de punção r de 6 mm

Observa-se na tabela 9 que o retorno elástico para todas as condições é de aproximadamente 6° resultando em um fator de retorno elástico (Ks) médio de 0,9303. Percebe-se ainda que com o punção avançando em 45 mm obtém-se um ângulo de dobramento de 90°.

A tabela 10 mostra a variação dos ângulos antes e após o carregamento para um raio de punção r de 9 mm.

Tabela 10 – Resultados do ensaio de dobramento para um raio de punção r de 9 mm

Nesse caso, foi possível mensurar a variação dos ângulos apenas dos três primeiros corpos de prova, sendo que os outros CP’s não atenderam os critérios de ensaio pré-estabelecidos. De qualquer forma, nota-se que a variação de raio do punção de 6 para 9 mm não alterou o valor do retorno elástico que permaneceu em torno de 6°.

A tabela 11 apresenta os resultados do dobramento de chapas com raio do punção igual a 12 mm.

Tabela 11 – Resultados do ensaio de dobramento para um raio de punção r de 12 mm

Através da tabela 9 percebe-se que o retorno elástico oscilou de 6° a 8°, mas permaneceu na sua maioria em aproximadamente 7° com um fator de retorno elástico (Ks) médio de 0,9145.

Consegue-se observar também que, de acordo com a análise de deformação anterior, o menor ângulo de dobra obtido sem ocorrência de falhas no material foi de 79,5°, uma vez que CP5 e CP6 apresentaram trincas durante o processo.

Conclusões 

Após todas as avaliações realizadas nesse trabalho, pode-se concluir que o objetivo principal de detectar a deformação do aço LN380 na região de tração em um processo de dobramento foi alcançado.

Nos ensaios de tração, o material apresentou tensão de escoamento igual a 469 MPa, tensão máxima de resistência de 539 MPa e deformação relativa de aproximadamente 29%, o que vem a confirmar as características disponibilizadas na página eletrônica do fabricante.

A máxima deformação mensurada na região externa das fibras no ensaio de dobramento foi de aproximadamente 0,26, o que equivale a um alongamento de 30 a 40% na região externa da chapa, ou seja, na região de tracionamento. 

Durante os ensaios de dobramento, também foi possível medir a variação do ângulo de dobra resultando em um retorno elástico de 6° a 7° variando de acordo com o raio do punção utilizado. O menor ângulo de dobra obtido sem que o material apresentasse trincas ou outra falha superficial foi de 79,5°.

Portanto, conclui-se que para o estudo em questão e condições pré-definidas, como deslocamento do punção, a variação dos ângulos e raios não interferiram significativamente no aumento ou diminuição do retorno elástico e nem na deformação na região de tracionamento do material durante o processo de dobra.

Co- autor 

Lírio schaeffer – schaefer@ufrgs.br   

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Monique Valentim da Silva Frees

Graduada em Engenharia Industrial Mecânica pela Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões – Santo Ângelo em 2008 e mestranda do curso de Engenharia Mecânica no Laboratório de Transformação Mecânica (LdTM), da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Atualmente é Engenheira de Produto da Spheros Climatização do Brasil S.A. Tem experiência na área de Engenharia de Produção, com ênfase em Pesquisa Operacional.